segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Acima de 100

E aquele fervor que incomoda. Ali, bem dentro da barriga, preso porém vivo. Brasas. É uma esfera com peso de tijolos e com brilho de estrela. Fantasia-se de ansiedade, deixa-me inquieto e em movimento, mas seus trejeitos lhe entregam. Fora daqui, impostor! Não sei bem quem tu és, mas conheço muito bem tuas consequências. A mim tu não enganas, resta-me apenas saber como lidar contigo. Aprender a te expremer, virar-te, amassar-te, tirar todo o teu sumo e embriagar-me com teu néctar viril.

Vai esperando, caro amigo. No momento tu me manipulas, deixas-me louco, és o rei desse feudo misterioso. Em breve, teu trono será meu. Estás fadado a ser meu súdito, trabalharás unicamente para meu prazer e minha serenidade. Estou ciente dos teus poderes e das maravilhas que és capaz. Resta-me apenas descobrir a fórmula para transformar os tijolos em penas e libertar aquela estrela de sua jaula, fazendo uma explosão radiante de luzes vir à tona e deixando rastros de beleza pelo meu caminhar incerto.

Estou chegando perto. Temas.

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Hoje estou com febre
Mas não foi o que o termômetro me falou
Perdoa-me, adorável, mas não preciso de ajuda para saber o momento em que estou em ebulição
Com sabedoria, reconheço o mal que me tomou
E passivamente, sinto. Sinto o tremor, a fúria e o calor de um vulcão em sua exuberante erupção



... só espero, com angústia, que aquele magma não suba para meu peito, dissolvendo todo meu coração...

terça-feira, 5 de julho de 2011

abaixo de zero

Um ano de frio, de muito frio. Frio que faz minha respiração servir apenas pra produzir o bafo que vai virar um desenho torto no vidro da janela. Frio que consegue congelar minhas lágrimas antes que elas possam sair da prisão dos meus olhos. Frio capaz de transformar essas mesmas lágrimas em duras e salgadas pedras de gelo, que mastigo e devoro com um prazer sombrio. Frio que assusta o sol, que - com medo de perder o seu calor - deixa tudo escuro. Tão escuro que nem mais a faísca que sai dos teus olhos conseguem me esquentar, ou, ao menos, me guiar. 

Um ano entrando no fundo do meu guarda-roupa todos os dias, sempre procurando o blusão mais bonito, o mais quente. Em vão. Nunca é o suficiente, é frio demais. Frio que gera neve que tudo encobre, todos os planos, todas as certezas. Tudo bem devidamente perdido dentro do frio.
Soterra.

Mas eu não me importo. Quando o sol tiver coragem, ele volta. Então tudo vai ficar claro como seu brilho imponente. E toda aquela brancura vai se derreter. E tu vai te derreter mais ainda, pois vão aparecer as flores mais coloridas e perfumadas que tu já pode ver, sentir, tocar. As flores mais bonitas, eu prometo! Ou então...
...só terra.
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quinta-feira, 30 de junho de 2011

Passado distantíssimo

Em algum bar, há muito tempo, em algum lugar do Rio Grande do Sul:

- E se teu filho que vai nascer não for Católico?
- O que que tem?
- Eu digo, como tu vai reagir, como tu vai lidar com isso?
- Normal, ué! Qual é o problema?!
- Ah, tu sabe, tem muitos problemas, as outras pessoas vão ficar falando...
- Pois pra mim não tem problema algum. Eu felizmente já não me importo com a opção religiosa das pessoas.
- Eu sei, eu também não tenho preconceito algum, longe de mim... Mas tu sabe como é... Se eu pudesse escolher, eu não vou mentir que preferiria mil vezes que meu filho fosse Católico.
- Pra mim que ele seja o que ele for, pra mim realmente não faz a menor diferença. Já não consigo mais entender essa preocupação toda com esse assunto...
- Ah, tu sabe que se ele não for Católico ele vai sofrer muito, né?! Imagina na escola o tanto de preconceito que ele vai ser vítima! Todos os colegas rindo da cara dele e ele chegando em casa triste, traumatizado, coitado. Aí depois tem que até procurar psicólogo pro guri, depois psiquiatra, remédio tarja preta, essas coisas... Infeliz...
- Infeliz?!
- Sim, infeliz! E agora imagina todo mundo, todos os amiguinhos dele, rezando Pai Nosso, Ave Maria, agradecendo Jesus pelas bençãos que Ele nos oferece... E teu filho lá num cantinho, excluído, ou pior, tendo que fingir uma prece sem acreditar ao menos em uma palavra da oração. Tadinho...
- Mas...
- E isso sem falar nas oportunidades de emprego perdidas, na violência gratuita contra ele, no mau olhar do Padre José e seus seguidores! Pobre...
-  Porra, tu fala de um jeito como que se quem não fosse católico fosse um miserável incapaz de ser feliz!!
- Não é isso, tu sabe que eu sou um cara bem mente aberta, mas toda essa gente do Padre José... Tu conhece eles... Eles nunca aceitariam alguém não Católico na comunidade e até eu e minha esposa sofreríamos as consequências caso nosso filho fosse um deles.
- E isso lá vai ser culpa do meu ou do teu filho?! Isso é culpa das pessoas que não aceitam que ele tenha a sua própria religião! Felizmente o mundo é imenso e existe uma infinidade de pessoas, muitas delas com ideias e características semelhantes às nossas, com as quais um bom relacionamento é possível. Com certeza haverá espaço de sobra, aqui ou em qualquer outro lugar, para que meu filho seja tão feliz quanto qualquer um, sendo católico ou não.
- Mas...
- A questão é que eu realmente não me importo com a religião dos outros e, inclusive, acho que as pessoas se preocupam demais com um assunto como esse, que no fim não vai fazer a mínima diferença na vida delas.
- Mas então pra ti realmente não faz diferença alguma se teu filho for um "não Católico"?!?
- Não!!! E acho incrível como as pessoas ainda se chocam com isso. A vida é exatamente ISSO! Não há motivo pra "exigir" uma uniformidade, poxa...
- Hmm, to começando a desconfiar que tu é um baita ateu, hein...
- Olha, se isso é de extrema importância pra ti, eu te digo que não, eu não sou ateu.
- É que eu não consigo entender... Como eu te disse, eu preferiria que meu filho fosse Católico. E olha que eu sou um cara totalmente sem preconceitos!
- Tá bom, depois continuamos esse assunto, nossas bebidas estão chegando...
- Finalmente!
- Um brinde! ...Que foi? Algo errado??
- É que esse piá me trouxe vinho branco em vez do tinto que eu tinha pedido. Ele sempre erra os pedidos! Só podia ser um crioulinho mesmo...

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Ainda bem que atualmente não existe nada parecido com isso, não é verdade?

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domingo, 10 de abril de 2011

Labirinto

Eu gosto de labirintos. Especialmente aqueles de cores verde-musgo, bem escuros, com muitas voltas, muitas falhas, muitas armadilhas. Especialmente aqueles que me sufocam, que me pressionam, quase me esmagam, que se fecham em torno de mim, tirando minhas forças e minha visão, mas me fazendo gargalhar de satisfação. Os que giram e não param de girar também são divertidos - fica mais complicado. E de repente começo a escutar cochichos que imploram por mim, e alguns pontos começam a brilhar, e eu me torno apenas mais um ser celeste em uma atmosfera infinitamente abafada. Os cochicos tornam-se vozes e logo em seguida gritos. Gritos de socorro, gritos de incerteza. É a minha mente pedindo pra sair dali - urgente. O labirinto está escuro demais, não há mais como achar a saída, diz ele. Confie em mim, vai ficar tudo bem, respondo. A velocidade aumenta, e quanto mais gira mais energia sinto, a ponto de levitar para depois voar e sentir o frescor do vento úmido batendo na minha face. É tão prazeroso... Mas eu agora eu preciso descansar - aterriso e fico ainda mais perdido. É tão gostoso... Corro, salto, giro, bato-me contra as paredes e dou muita risada de tudo isso. A saída? Quem disse que existe?!

"Mas você disse para confiar em você!", reclama.

"Não, nunca confie em mim, nunca confie no que digo, nunca."
.silêncio.
"Ah, eu já te disse que gosto de labirintos?"


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Domingo de sol aqui. Dia de Mauerpark! =)





segunda-feira, 4 de abril de 2011

Uma Sopa

São 10h da manhã e ele está dormindo. Dentro dos seus sonhos ele foge de dezenas, talvez centenas de abelhas. Elas não desistem de persegui-lo por mais rápido que ele corra. E elas fazem um barulho horrível, um 'ZZZZ" ensurdecedor. Agora já são milhares de abelhas, o zumbido fica ainda pior 'ZZZZZZZZZ!'. Ele precisa achar um rio, um lago, enfim, água! Rápido!!

ZZZZZZZZZZZZ!!!

"ZZZZZ!", toca a campainha. Ele demora uma fração de segundos pra se localizar. "Onde estou?! Que dia é hoje?! Tenho aula?!". São centésimos de segundo de agonia e desespero. Mas também são milésimos de segundo de liberdade - nada mais importa, a noção já fora embora, sou apenas um corpo.

Aos poucos o quebra-cabeça vai sendo solucionado. Por algum motivo ele está dormindo no sofá e por algum motivo sua cabeça doi e seu corpo pede socorro. Ah, sim, a noite anterior deve ter algo relacionado com isso. Duas pessoas estranhas entram no apartamento carregando um aspirador em pó e perguntam algo indecifrável para aquela hora da manhã. Ele apenas responde "sim, claro!". Os dois rapazes atravessam a sala, sobem as escadas e ligam o equipamento que carregavam. O zumbido das abelhas era muito mais prazeroso que aquele que agora ouve. Saudades de seus sonhos, quem nunca teve... 

Em apenas 2 minutos, ou menos, o serviço fora feito e os dois figurantes deixam o palco desejando um bom dia ao personagem principal.

O bom dia começou com ele lutando para levantar-se do sofá e sofrendo para chegar ao banheiro. Lá ele senta-se na privada e vê o mundo girar. E como gira, e como dá voltas esse mundo. Com muito sacrifício consegue tomar um banho, mesmo que cada gota de água rasgue sua pele à medida que vai escorrendo pelo seu corpo. Na sua cabeça só há espaço para arrependimentos e promessas de que isso nunca irá se repetir. "Ah, como a vida é sem graça, como tudo é superficial, como as pessoas são sanguessugas, como tudo é lento, arrastado e desinteressante..."

Por fim, devidamente arrumado, percebe que tem fome. Há de comer. É um humano e humanos sobrevivem de alimentos, entre outras coisas. Abre sua geladeira e enxerga pão, ovos, queijo, ketchup e cebolas. Seu estômago manda um recado ao seu cérebro "Isso não! Isso é impossível agora". Ele pensa em como a natureza é injusta, pois ele necessita comer mas ao mesmo tempo não pode, não é capaz. Ah, se todas comidas fossem vendidas em formatos de pílulas, estilo vitaminas ou algo similar, mas contendo todos os nutrientes necessários para o bom funcionamento de nossas habilidades. Tudo seria mais simples e rápido. Claro, teriam aqueles que contestariam essa ideia pois o prazer em comer deixaria de existir. Mas nesse momento o prazer em comer não está em suas prioridades, ele só precisa de algo que o deixe instantaneamente vivo novamente.

Decide vasculhar a geladeira mais uma vez. Atrás das cebolas encontra algo diferente. Tira as cebolas da frente daquele objeto misterioso e se depara com uma sorridente garrafa de vodka. Um sorriso sarcástico, claro. Seu estômago embrulha e implora para mandar algo para fora. Sorte que ele está há algumas horas sem comer, então não há perigo de sujar o chão recém limpo pelos dois sujeitos estranhos. Fechada a magra geladeira, passada as náuseas, uma imagem salvadora e iluminada surge em sua cabeça: daria tudo por uma sopa. Uma sopinha. Bem quentinha, bem cremosa, perfeitamente temperada. Poderia ser de batatas, com fatiazinhas bem macias daquele tubérculo sendo suavemente mastigados pelos seus ferozes e necessitados dentes. Ou então poderia ter pedacinhos suculentos de carne, não importava o tipo, apenas carne. Mas teria que ser pedacinhos pequenos mesmo, tipo guisado, senão seu organismo teria que trabalhar demais pra fazer a digestão. Ah, e se tivesse um temperinho verde pra dar aquele sabor especial, aí sim seria perfeito... Hmm, interessante como as pessoas entram em contradição tão rapidamente. Quem seria tão idiota e insensível a ponto de querer se alimentar apenas de pílulas?!

Partiu, então, em busca de seu idealizado objetivo. E já sabia até onde encontrá-lo! Obviamente seria no restaurante ao lado de seu prédio, pois assim o calvário seria menor. Chama o elevador. Pra variar, ele não está no andar em que nosso amigo se encontra. Aliás, o elevador do seu prédio é capaz de extinguir qualquer probabilidade. Sempre que precisa-se dele no terceiro (e último) andar, ele econtra-se no térreo. Sempre quando necessita-se dele no térreo, ele está no terceiro.

Após longa espera, abrem-se as portas da esperança. Ele entra na caixa metálica e aperta o número "0", que estranhamente significa térreo. O desespero toma conta no espaço de 1m²: havia esquecido sua chave dentro do seu quarto. Teria que voltar, tocar a campainha e acordar seu colega de quarto. Seu colega de quarto ficaria irritado com tamanha afronta e começaria a sabotá-lo. Talvez como forma de vingança tentasse roubar seus pertences, ou então colocasse um vírus em seu computador. Sua vida se tornaria um inferno, teria que procurar outro lugar para morar. Estava completamente perdido...

Ainda no elevador resolve mexer no seu bolso. Ah, a chave estava ali! Incrível! Que alívio... Tenta se lembrar do momento em que a colocou no bolso mas logo desiste. Não faz ideia. "Curioso como às vezes agimos como legítimos robôs", pensa. "São ações meramente automáticas. Não raro até nossos pensamentos seguem determinada programação", conclui desanimado.

Sai do elevador e dirige-se à porta da recepção. Antes é obrigado a passar pelo pátio do prédio e lá observa coisas estranhas. Há pessoas vestidas de noivas, há seres fantasiados de Elvis Presley, há crianças brincando com bola e gritando, há até mesmo câmeras filmando isso tudo. Nada disso chama sua atenção, nada disso tem alguma importância. Mesmo que uma espécie rara de dinossauro passasse na sua frente, ele não daria bola (não que existam muitas espécies de dinossauros não raras nos dias de hoje...). Ele tem apenas um objetivo e está determinado a alcançá-lo. Ele quer - e como quer! - uma sopa.

Já está na rua e caminha para o restaurante vizinho. Ele sabe que esse restaurante tem a fama de ser caro, mas  não deve ser tanto assim, as pessoas costumam exagerar um pouco. Chega na frente do local e lê o quadro escrito a giz: "Promoção - salada por apenas 12 merckels". Doze merckels por uma salada?? O mundo capitalista não é nada justo. 

E assim ele muda seus planos e decide procurar outro lugar que venda sopas por um preço justo, ou, no mínimo, acessível. Caminha pela rua como um zumbi, nada enxerga e nada escuta. A parte humana que um dia existira em seu corpo já não encontra-se mais presente, agora é apenas um animal seguindo seu instinto de sobrevivência. Avista um lugar chamado "Super Sopa". Seu coração bate mais forte, seu cérebro volta a funcionar e a hipotetizar. Certamente naquele recinto eles devem ter todos os tipos de sopa existentes no mercado. Com certeza desfrutará da melhor sopa já degustada em sua vida. Afinal, não é qualquer lugar que possui a coragem e o respeito necessário para auto denominar-se "Super Sopa". 

Aproxima-se do paraíso, entra, checa o cardápio. Peixe e batatas, salmão, peixe especial com batatas, porção grande, porção pequena, bacalhau e batatas, apenas batatas, peixe com cebolas e batatas... ONDE ESTÃO AS SOPAS??? Não existem sopas. Não existe sequer UMA sopa no restaurante chamado "Super Sopa". Tenta entender por que às vezes o ser humano é tão cruel, tão incompreensível com o sentimento dos outros, a ponto de não vender sopas em um lugar em que obrigatoriamente tal negócio deveria ser realizado. Desiste. Sua abstinência de comida e a complexidade de seus pensamentos não o permitem encontrar a resposta. Volta para a rua e continua sua busca ao tesouro.

Segue caminhando pela rua sem destino certo. Durante o percurso acizentado, encontra muitos restaurantes, inúmeras opções, o que significam escolhas a serem feitas. Às vezes escolhas são ruins, escolhas cansam, escolhas doem. Requerem decisões e responsabilidade pelo seu resultado, o que geralmente não é de nosso agrado. Não sabe para onde ir, não sabe onde mais tentar a sorte. Está cansado, pensa inclusive em voltar para casa com a missão incompleta. Continua, entretanto, sua jornada...

"Sopa de batata com pedaços de carne: 4 merckels". Talvez seja uma miragem. Esfrega seus olhos, lê novamente. "Sopa de batata com pedaços de carne: 4 merckels". Se estivesse vivo, se não fosse um zumbi, choraria. Não chora, apenas caminha, mas dessa vez caminha com vontade, com gana. Tudo começa a ficar mais colorido, a vida ganha uma razão de existir. Ah, que dia lindo, que ar maravilhoso! Como é bom estar aqui, olha como aquelas crianças são lindas brincando na grama, que por sinal é incrivelmente verde!!!

Dá passos firmes em direção ao balcão. Não pensa - as palavras apenas saem da sua boca como se seus lábios tivessem vida própria, como se fossem uma máquina. Máquina que são, cometem erros e misturam idiomas diferentes. Perdoável, pois a excitação é grande, é gigante. Perguntam a ele se ele deseja pão para acompanhar a sopa. Seriam eles capazes de tamanha generosidade? Pão com a sopa?! Como o ser humano é bondoso, como é compreensível com os seus similares, sempre entendendo as dificuldades alheias... Claro que ele aceita! Muito obrigado, meu amigo!

De posse do seu bem mais precioso, segurando-o firme com a duas mãos, procura um lugar livre para sentar-se na parte de fora do restaurante, sob sol que infelizmente está coberto por nuvens. Sem dificuldades, encontra um assento. Senta-se. Respira. Olha para sua sopa, admira-a por alguns instantes. Como é bela, como é perfeita, como é viscosa. Agarra sua colher e come. Come como nunca tinha comido antes. Devora. Se pudesse não utilizaria colher, beberia tudo direto da tigeja, sem pudor nem culpa. Controla-se. Vai saboreando cada colherada ao máximo. De vez em quando molha o pãozinho no líquido sagrado e mastiga aquela combinação perfeita com suave ardor. Vai sorvendo cada gota daquela sopa maravilhosa. Sente todos os nutrientes sendo absorvidos pelo seu organismo. Imagina seu coração bombeando com extremo alívio um sangue revitalizado, um sangue vermelho brilhante, para as demais partes de seu corpo. Está realizado, está deliciado e não precisa de mais nada. Está apenas completamente feliz.

Faltam apenas duas colheradas para terminar sua refeição e já se dá por satisfeito. Obviamente irá terminar o serviço, pois não será sacrifício algum. Olha para seu lado e percebe que há uma latinha de Coca-Cola no chão, há uns 5 metros de si. Por algum motivo, a latinha vermelha chama sua atenção. Analisa com maior cuidado e percebe que há uma abelha sobrevoando as redondezas daquele objeto. A abelha efetua alguns rasantes, alguns mergulhos e finalmente toma coragem de aproximar-se do cilindro metálico.

Com toda a calma do mundo, com a suavidade de uma pena, a abelha pousa. Sem pudor nem culpa, ela caminha até a boca da latinha. Ela encontra algumas gotas da sua refeição favorita e as sorve ferozmente, com a intensidade do voo de uma lagarta recém descoberta borboleta. Ela também está realizada. Está apenas completamente feliz.

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E nesse momento, as nuvens cedem espaço ao poderoso brilho do sol. Um horizonte infinito e iluminado fora revelado. Um céu azul e promissor fora encontrado. 

Tudo isso graças a uma sopa.


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domingo, 3 de abril de 2011

On the Other Side

Here we go with my second text in English. This one was created from an idea that my classmate Elena had. We had chosen one song and we wrote something from the 'song inspiration'. The chosen song was The Strokes - On the Other Side (I could embed the Youtube link here if I wasn't living in Berlin. Here in Germany most music videos are blocked due to issues between the record labels and the German YT. It really sucks!). This text also reflects some thoughts that can be found in my last 2 texts, so the Brazilian readers are going to notice some coincidences :)


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He lives in a bubble. It's hard when you can't be seem and when you can't be heard by anyone, even if you shout so loud that you can feel your lungs being smashed inside your painful body.
But the funny thing is that he's not a prisoner from the bubble, he can get out of it whenever he wants - but he never wants.
It's also hard to him to see everything plainly white and black, even though he knows everything around him is so amazingly shiny and colorful. Unfortunately, all he can feel is nothing. It's just a dark and cold cave and all he can do is keep walking alone, dizzy and inert, running in circles, without any direction, with no objectives.
Walk, run, walk... Take care not to get lost in your cave, my friend.

He wants everything. He wants to live right now - he wants to live also the future now.
He wants to learn everything, but he does not want to learn too much - sometimes it can be dangerous. ..
He wants to walk in the clouds - but he doesn't want to walk with no floor in a white forest.
He wants to walk on the street - but he also needs freedom for his feet.

He got lost in his cave. He got stuck in his viscous bubble.
Now he doesn't want everything anymore.
Now he just wants nothing.

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Wake up. There is a nice weather outside.
I know you can get everything you want, and I also know how difficult is when you actually don't know what you really want.
But try to feel it now, open your eyes, breath the fresh new air, you need it sometimes.
Go!


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His bubble had exploded, he felt the joyful water running through his fingers, he smelled the sweet fragrance of an air not too stuffy as before.
Slowly, bit by bit, he was able to see the colors again - first the brown, then the yellow, and finally the blue.
He's on the other side now. It seems that everything reached its maximum fulfillment, all the chains were broken and there is no fear and no doubts anymore. It's just like a sweet colorful explosion bursting out from your veins and reaching everybody surround you with its magical, powerful and ardent spell. Simple like that...

Oh, the other side is so bright, so full of energy, so delicious and exciting...
...At least for a while...
...Because soon the other side will become just another old grey side...


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quinta-feira, 31 de março de 2011

Coisas Boas

Como é ruim só conseguir enxergar o preto e o branco quando as cores são as mais reluzentes já vistas.
Como é ruim sentir o peso do vazio amassando, amassando, amassando...
Como é ruim provar um pouco do doce só pra depois se entupir do amargo.
E como é pior quando o doce estraga e amargo fica.

Como é ruim não conseguir escutar, não conseguir apreciar
Como é ruim poder escutar mas não ter o que admirar
Como é ruim viver em uma bolha, sem poder ser visto, sem poder gritar
E como é pior preferir a bolha a qualquer outro lugar.

Como é ruim caminhar nas nuvens, sem chão, sem direção
Como é ruim caminhar na rua, limitado, sem ação
Como é ruim ser percebido como uma grande ficção
E como é pior perceber tudo como uma grande ilusão.

Como é ruim ser incapaz, tentar conseguir, mas não ter forças.
Como é ruim não compreender, tentar descobrir e continuar não compreendendo.
Como é ruim saber que tudo pode ser colorido, leve, doce, amplo, livre, real, real, real...
Mas como é pior na real não ser nada, na real não estar nada.

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terça-feira, 22 de março de 2011

Agora

Aos poucos vai chegando e ele vai sentindo.
Sentindo sem poder explicar. Até porque não poderia.
Tudo é tão belo e tão agradável, do jeito que sempre quis.
Mas tudo tão vazio e frágil. Apenas um toque e puf - desmancha.
Desmancha e incomoda. Desmancha e irrita.
"Nicht interessant, nicht interessant..."

Tenta fugir pra descobrir. Foge e não descobre.
Pior, foge e se perde. Perde-se profundamente.
A hora é agora, mas onde estão escondidos?!
Talvez o que lhe dizem é verdade, aliás, nunca negou.
Sempre soube, mas sempre teve medo.
"Verrückt! Verrückt!"

Sua noção de tempo já está distorcida.
Quer o futuro sem deixar o presente. Quer demais, quer demais...
Tem medo do depois, tem medo do agora. Teme.
Incapaz e inerte ele tenta e não para de tentar.
Pensamentos distantes vão crescendo, mas é bobagem.
Nunca atingirão a maturidade.
"Achtung! Achtung!"

Aos poucos, aos poucos...
Quer parar de atuar pra amarga plateia.
Quer viver no palco com seus amados.
Todos compreendendo tudo, mesmo sem entender nada.
Tirar as pedras do estômago, um ar fresco para sua pele.
Um ar fresco de primavera.
Ou, melhor, um ar quente de inverno.
É o que precisa.
"Jetzt"

sábado, 12 de março de 2011

New Seas

When she clumsily and ungracefully entered late into the classroom, Adam immediately felt something magically different in the air. Her name was Emily and she had a conspicuously strong Canadian accent, although his amusing way of speaking didn’t let him lie he wasn’t from Australia. Both were in Ireland, putting up with the absolutely unpredictable Irish weather, in order to get a diploma in Arts. Of course they had crossed the world for other reasons as well. They intuitively knew it’s easier to forget and to start anew when you feel the wind being blown smoothly by a different sea. And so they courageously took a risk of revivifying their painfully broken hearts. Weeks of complete fulfillment came. It was just totally pure love and nothing else to care about.

However, June came and in June things tend to change creepily. Adam had to move to Greece. Emily surprisingly had to return to Canada. But they deeply loved each other, so promises were made. He would go to Vancouver incredibly soon. He took forever. She would be passionately waiting for him. Unhopefully, she just waited.

It was a new season. New seasons require fresh air. New seasons require new seas.

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Esse texto foi escrito há quase 2 meses e era um tema ("tarefa", "lição", "dever", pra quem não sabe gauchês) do curso de inglês.

Fiz uma releitura dele hoje e me identifiquei com o meu momento agora. Novos mares e ar fresco, uma nova temporada. Começar tudo do 0, tudo de novo. Dá medo e, sim, é difícil. Mas rapidamente a massa vai tomando forma e as cores ficam mais palpáveis.

Desta maneira, o que me resta é desfrutar de todas as cores e de todas as formas que aparecerem. Desfrutar e esperar. Pois em junho as coisas tendem a mudar lenta porém completamente. Afinal, junho é uma nova temporada, e, acima de tudo, uma nova (mais uma) estação.

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Não, não esperem um texto em alemão daqui 3 meses.

Tchüs.